Neste nosso quinquagésimo segundo comentário sobre Os Lusíadas, continuaremos a ler o sexto canto da obra, onde Camões canta que Baco solicita um conselho com todos deuses do mar para Netuno, este que aceita e os convoca.

OS LUSÍADAS A VISITA DE BACO AO REINO DE NETUNO
A convocação para o conselho dos deuses do mar

 CANTO VI – ESTROFE 15

“Baco pede a Netuno que convoque todos os deuses do mar para um conselho”

 

“Ó Netuno, lhe disse, não te espantes

De Baco nos teus reinos receberdes,

Porque também c’os grandes e possantes

Mostra a fortuna injusta seus poderes.

Manda chamar os deuses do mar, antes

Que fale mais, se ouvir-me o mais quiseres.

Verão da desventura grandes modos:

Ouçam todos o mal que toca a todos!”

 

“Ó Netuno, lhe disse, não te espantes de Baco nos teus reinos receberdes, porque também c’os grandes e possantes mostra a fortuna injusta seus poderes. Manda chamar os deuses do mar, antes que fale mais, se ouvir-me o mais quiseres. Verão da desventura grandes modos: ouçam todos o mal que toca a todos! (1)

(1) “Ó Netuno, lhe disse o rei do vinho, não fique espantado por receber Baco nos teus reinos, porque a Fortuna, assim como favorece, também é injusta com os grandes e poderosos. Mande chamar os demais deuses do mar que moram no teu reino, caso realmente queira me ouvir, pois que uma situação terrível acontece e que pode afetar a todos.” Camões canta que o Baco, estando diante de Netuno, solicita um concílio para falar sobre a empreitada dos portugueses.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Ó Netuno, lhe disse o rei do vinho, não fique espantado por receber Baco nos teus reinos, porque a Fortuna, assim como favorece, também é injusta com os grandes e poderosos. Mande chamar os demais deuses do mar que moram no teu reino, caso realmente queira me ouvir, pois que uma situação terrível acontece e que pode afetar a todos.”

CANTO VI – ESTROFE 16

“Netuno aceita o pedido de Baco e manda Tritão, seu filho, convocar os deuses do mar para um conselho”

 

Julgando já Netuno que seria

Estranho caso aquele, logo manda

Tritão, que chame os deuses da água fria.

Que o mar habitam duma e doutra banda.

Tritão, que de ser filho se gloria

Do rei e de Salácia veneranda,

Era mancebo grande, negro e feio,

Trombeta de seu pai e seu correio.

 

“Julgando já Netuno que seria estranho caso aquele, logo manda Tritão, que chame os deuses da água fria. Que o mar habitam duma e doutra banda. Tritão, que de ser filho se gloria do rei e de Salácia veneranda, era mancebo grande, negro e feio, trombeta de seu pai e seu correio. (1)

(1) Netuno, que julgava aquele caso seria muito peculiar, logo manda Tritão, chamar os deuses que moram nas águas dos mares. Tritão era um filho orgulhoso de Netuno com a veneranda Salálica; ele era grande negro e feio, e carregava a trombeta de seu pai e seu correio. Camões canta que Netuno atende ao pedido de Baco e manda seu filho Tritão convocar um concílio dos deuses dos mares.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Netuno, que julgava aquele caso seria muito peculiar, logo manda Tritão, chamar os deuses que moram nas águas dos mares. Tritão era um filho orgulhoso de Netuno com a veneranda Salálica; ele era grande negro e feio, e carregava a trombeta de seu pai e seu correio.”

CANTO VI – ESTROFE 17

“Descrição da horrível aparência de Tritão”

 

Os cabelos da barba, e os que descem

Da cabeça nos ombros, todos eram

Uns limos prenhes d’água, e bem parecem

Que nunca um brando pente conheceram:

Nas pontas pendurados não falecem

Os negros mexilhões que ali se geram;

Na cabeça por gorra tinha posta

Uma mui grande casca de lagosta.

 

“Os cabelos da barba, e os que descem da cabeça nos ombros, todos eram uns limos prenhes d’água, e bem parecem que nunca um brando pente conheceram: nas pontas pendurados não falecem os negros mexilhões que ali se geram; na cabeça por gorra tinha posta uma mui grande casca de lagosta. (1)

(1) Os cabelos da barba do Tritão e os de sua cabeça eram uns limos cheios d’água que pareciam nunca terem visto um brando pente na vida; na ponta desses limos não faltavam os negros mexilhões que ali se geraram; em sua cabeça usava uma grande casca de lagosta como gorro. Camões descreve a aparência de Tritão, filho do deus Netuno.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Os cabelos da barba do Tritão e os de sua cabeça eram uns limos cheios d’água que pareciam nunca terem visto um brando pente na vida; na ponta desses limos não faltavam os negros mexilhões que ali se geraram; em sua cabeça usava uma grande casca de lagosta como gorro.”

CANTO VI – ESTROFE 18

“Descrição da horrível aparência de Tritão”

 

O corpo nu e os membros genitais,

Por não ter ao nadar impedimento;

Mas porém de pequenos animais

Do mar todos coberto cento e cento:

Camarões e carangrejos, e outros mais

Que recebem Febe crescimento;

Ostras e briguigões do musgo sujos,

Às costas com casca os caramujos.

 

“O corpo nu e os membros genitais, por não ter ao nadar impedimento; mas porém de pequenos animais do mar todos coberto cento e cento: camarões e carangrejos, e outros mais que recebem Febe crescimento; ostras e briguigões do musgo sujos, às costas com casca os caramujos. (1)

(1) Tritão tinha o corpo nu e também nu os membros genitais, para que assim não tivesse dificuldade para nadar; o corpo todo coberto pequenos animais do mar: camarões e caranguejos, e outros mais que recebem crescimento de Febe, a deusa da Lua; ostras e berbigões do sujo musgo e caramujos com cascas nas costas. Camões descreve a aparência de Tritão, filho do deus Netuno.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Tritão tinha o corpo nu e também nu os membros genitais, para que assim não tivesse dificuldade para nadar; o corpo todo coberto pequenos animais do mar: camarões e caranguejos, e outros mais que recebem crescimento de Febe, a deusa da Lua; ostras e berbigões do sujo musgo e caramujos com cascas nas costas.”

CANTO VI – ESTROFE 19

“Tritão assopra sua grande concha, convocando todos os deuses do mar para o conselho no palácio de Netuno”

 

Na mão a grande concha retorcida

Que trazia, com força já tocava:

A voz grande canora foi ouvida

Por todo o mar, que longe retumbava.

Já toda a companhia apercebida

Dos deuses para os paços caminhava

Do deus que fez os muros da Dardânia,

Destruídos depois da grega insânia.

 

“Na mão a grande concha retorcida que trazia, com força já tocava: a voz grande canora foi ouvida por todo o mar, que longe retumbava. Já toda a companhia apercebida dos deuses para os paços caminhava do deus que fez os muros da Dardânia, destruídos depois da grega insânia. (1)

(1) Tritão trazia em sua mão uma grande concha retorcida, soprando-a com força como uma trombeta: a voz sonora foi ouvida por todo o marque, retumbando ao longe. Ouvindo o chamado, toda uma companhia de deuses caminhava para o palácio de Netuno, o deus que fez os grandes muros de Troia que foram destruídos pela ira dos gregos. Camões canta que Tritão sopra a grande concha como se fosse uma trombeta, convocando os deuses marítimos para o concílio no palácio de Netuno.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Tritão trazia em sua mão uma grande concha retorcida, soprando-a com força como uma trombeta: a voz sonora foi ouvida por todo o marque, retumbando ao longe. Ouvindo o chamado, toda uma companhia de deuses caminhava para o palácio de Netuno, o deus que fez os grandes muros de Troia que foram destruídos pela ira dos gregos.”

CANTO VI – ESTROFE 20

“Oceano, Nereu e Proteu chegam ao conselho”

 

Vinha o Padre Oceano, acompanhado

Dos filhos e filhas que gerara;

Vem Nereu, que com Dóris foi casado,

Que todo o mar de ninfas povoara;

O profeta Proteu, deixando o gado

Marítimo pascer pela água amara,

Ali veio também; mas já sabia

O que o padre Lieu no mar queria.

 

“Vinha o Padre Oceano, acompanhado dos filhos e filhas que gerara; vem Nereu, que com Dóris foi casado, que todo o mar de ninfas povoara; o profeta Proteu, deixando o gado marítimo pascer pela água amara, ali veio também; mas já sabia o que o padre Lieu no mar queria. (1)

(1) Vinha o padre Oceano acompanhado dos filhos e filhas que gerara; vem Nereu, que com Dória foi casado e que povoou todo o amar de ninfas; vinha também o profeta Proteu, deixando o gado marítimo de focas pastar nas águas salgadas e que já sabia o que Baco queria ao visitar o reino dos mares. Camões canta que chegam os deuses dos mares para concílio.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Vinha o padre Oceano acompanhado dos filhos e filhas que gerara; vem Nereu, que com Dória foi casado e que povoou todo o amar de ninfas; vinha também o profeta Proteu, deixando o gado marítimo de focas pastar nas águas salgadas e que já sabia o que Baco queria ao visitar o reino dos mares.”

CANTO VI – ESTROFE 21

“Anfitre, esposa de Netuno, chega ao conselho”

 

Vinha por outra parte a linda esposa

De Netuno, de Celo e de Vesta filha,

Grave e leda no gesto, e tão fermosa,

Que se amansava no mar de maravilha.

Vestida uma camisa preciosa

Trazia de delgada beatilha,

Que o corpo cristalino deixa ver-se;

Que tanto bem não é pera esconder-se.

 

“Vinha por outra parte a linda esposa de Netuno, de Celo e de Vesta filha, grave e leda no gesto, e tão fermosa, que se amansava no mar de maravilha. Vestida uma camisa preciosa trazia de delgada beatilha, que o corpo cristalino deixa ver-se; que tanto bem não é pera esconder-se. (1)

(1) Por outra parte vinha Anfitre, esposa de Netuno e filha de Celo e Vesta; chegava com um aspecto majestoso que era capaz de deixar o mar maravilhado e manso. Vestia um precioso vestido transparente para deixar o cristalino corpo a mostra, já que tão belo não devia ser escondido. Camões canta a chegada dos deuses ao concílio no palácio de Netuno, comentando agora a chegada de Anfitre, esposa do rei dos mares.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Por outra parte vinha Anfitre, esposa de Netuno e filha de Celo e Vesta; chegava com um aspecto majestoso que era capaz de deixar o mar maravilhado e manso. Vestia um precioso vestido transparente para deixar o cristalino corpo a mostra, já que tão belo não devia ser escondido.”

CANTO VI – ESTROFE 22

“Descrição de Anfitre, esposa de Netuno”

 

Anfitrite, fermosa como as flores,

Neste caso não quis que falecesse:

O delfim traz consigo que aos amores

Do rei lhe aconselhou que obedecesse.

C’os olhos, que de tudo são senhores,

Qualquer parecerá que o Sol vencesse.

Ambas vêem pela mão, igual partido,

Pois ambas são esposas dum marido.

 

“Anfitrite, fermosa como as flores, neste caso não quis que falecesse: o delfim traz consigo que aos amores do rei lhe aconselhou que obedecesse. C’os olhos, que de tudo são senhores, qualquer parecerá que o Sol vencesse. Ambas vêem pela mão, igual partido, pois ambas são esposas dum marido. (1)

(1) Anfitrite, que é formosa como as flores, não quis faltar, trazendo consigo o golfinho que aconselhou que obedecesse aos amores do rei. Tétis e Anfitrite, por serem tão belas, parece que conquistasse o Sol com os olhares; elas vêm de mãos dadas e em igual condição, pois ambas são esposas do mesmo marido. Camões canta a presença de Anfitrite e Tétis no concílio dos deuses dos mares.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Anfitrite, que é formosa como as flores, não quis faltar, trazendo consigo o golfinho que aconselhou que obedecesse aos amores do rei. Tétis e Anfitrite, por serem tão belas, parece que conquistasse o Sol com os olhares; elas vêm de mãos dadas e em igual condição, pois ambas são esposas do mesmo marido.”

CANTO VI – ESTROFE 23

“Ino chega ao conselho no palácio de Netuno”

 

Aquela, que das fúrias de Atamante

Fugindo, veio a ter dividido o estado,

Consigo traz o filho, belo infante,

No número dos deuses relatado.

Pela praia brincando vem diante

Com as linda conchinhas, que o salgado

Mar sempre cria, e às vezes pela areia

No colo o toma a bela Panopeia.

 

“Aquela, que das fúrias de Atamante fugindo, veio a ter dividido o estado, consigo traz o filho, belo infante, no número dos deuses relatado. Pela praia brincando vem diante com as linda conchinhas, que o salgado mar sempre cria, e às vezes pela areia no colo o toma a bela Panopeia. (1)

(1) Ino, aquela princesa que, fugindo das fúrias de Atamante, veio a ser transformada em divindade; ele vem ao concílio trazendo o filho, este é contado no número dos deuses e vem pela praia brincando com as conchinhas que o salgado mar sempre cria e, às vezes, vem no colo da bela ninfa Panopeia. Camões canta a presença de Ino e seu filho no concílio.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Ino, aquela princesa que, fugindo das fúrias de Atamante, veio a ser transformada em divindade; ele vem ao concílio trazendo o filho, este é contado no número dos deuses e vem pela praia brincando com as conchinhas que o salgado mar sempre cria e, às vezes, vem no colo da bela ninfa Panopeia.”

CANTO VI – ESTROFE 24

“Glauco chega ao conselho no palácio de Netuno”

 

E o Deus que foi num tempo corpo humano,

E por virtude da erva poderosa

Foi convertido em peixe, e deste dano

Lhe resultou deidade gloriosa,

Inda vinha chorando o feio engano

Que Circe tinha usado co’a fermosa

Cila, que ele ama, deste sendo amado;

Que a mais obriga amor mal empregado.

 

“E o Deus que foi num tempo corpo humano, e por virtude da erva poderosa foi convertido em peixe, e deste dano lhe resultou deidade gloriosa, inda vinha chorando o feio engano que Circe tinha usado co’a fermosa Cila, que ele ama, deste sendo amado; que a mais obriga amor mal empregado. (1)

(1) E também vem Glauco, o deus que já teve corpo humano, mas por comer a erva poderosa, foi convertido em divindade gloriosa; ele vinha chorando o mal que Circe tinha feito contra à formosa Cila que ele tanto amava; pois essa maldade é característica do amor quando ele é rejeitada. Camões canta a chegada de Glauco no concílio.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“E também vem Glauco, o deus que já teve corpo humano, mas por comer a erva poderosa, foi convertido em divindade gloriosa; ele vinha chorando o mal que Circe tinha feito contra à formosa Cila que ele tanto amava; pois essa maldade é característica do amor quando ele é rejeitada.”

 

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Esses foram os nossos comentários sobre a décima quinta até a vigésima quinta estrofe do sexto canto de Os Lusíadas, onde Camões canta que Baco solicita um conselho com todos deuses do mar para Netuno, este que aceita e os convoca.

 

Eu sou Caio Motta e convido você a continuar acompanhando os nossos comentários sobre a grande obra de Camões, bem como demais textos da grande literatura universal presentes no nosso blog.

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