Neste nosso sexagésimo oitavo comentário sobre Os Lusíadas, continuaremos de ler o oitavo canto da obra, onde Camões canta os questionamentos que o rei Samorim de Calecut faz ao capitão Vasco da Gama.

OS LUSÍADAS O EMBAIXADOR PORTUGUÊS E O REI DE MELINDE
Os questionamentos do rei Samorim ao capitão Vasco da Gama

CANTO VIII – ESTROFE 58

“O capitão Vasco da Gama vai até o rei Samorim para saber a resposta de sua proposta”

 

Falar ao rei gentio determina

Por que com seu despacho se tornasse;

Que já sentia em tudo da malina

Gente impedir-se quando desejasse.

O rei, que da notícia falsa e indina

Não era d’ espantar se s’espantasse,

Que tão crédulo era em seus agouros,

E mais sendo afirmados pelos Mouros,

 

Falar ao rei gentio determina por que com seu despacho se tornasse; que já sentia em tudo da malina gente impedir-se quando desejasse. O rei, que da notícia falsa e indina não era d’ espantar se s’espantasse, que tão crédulo era em seus agouros, e mais sendo afirmados pelos Mouros, (1)

(1) O capitão Vasco da Gama resolveu falar com o rei gentio de Calecut para saber da resposta da proposta e, assim, ele e sua frota retornassem para Portugal, pois o capitão já sentia que seria impedido pela maligna. Não seria uma surpresa que o rei Samorim, ao saber da falsa informação dada pelos feiticeiros, ficasse espantado, já que confiava muito neles e que tal afirmação seria confirmada pelos sacerdotes mouros. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, antevendo a possibilidade de um conflito contra os senhores de Calecut, vai até o rei Samorim para obter a resposta da proposta de aliança com Portugal.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

O capitão Vasco da Gama resolveu falar com o rei gentio de Calecut para saber da resposta da proposta e, assim, ele e sua frota retornassem para Portugal, pois o capitão já sentia que seria impedido pela maligna. Não seria uma surpresa que o rei Samorim, ao saber da falsa informação dada pelos feiticeiros, ficasse espantado, já que confiava muito neles e que tal afirmação seria confirmada pelos sacerdotes mouros.

CANTO VIII – ESTROFE 59

“O rei Samorim estava indeciso, não sabendo se deveria se aliar ou não aos portugueses”

 

Este temor lhe esfria o baixo peito;

Por outra parte a força da cobiça,

A que por natureza está sujeito,

Um desejo imortal lhe acende e atiça;

Que bem vê que grandíssimo proveito

Fará, se com verdade e com justiça

O contrato fizer por longos anos,

Que lhe comete o rei dos Lusitanos.

 

Este temor lhe esfria o baixo peito; por outra parte a força da cobiça, a que por natureza está sujeito, um desejo imortal lhe acende e atiça; que bem vê que grandíssimo proveito fará, se com verdade e com justiça o contrato fizer por longos anos, que lhe comete o rei dos Lusitanos. (1)

(1) O medo do que pode acontecer se os portugueses realmente lhe atacassem deixava o coração do rei Samorim inquieto; por outro lado, a sua ambição, que por natureza ele estava sujeito, atiçava o desejo de enriquecer, pois sabia que seria muito proveitosos se aceitasse a aliança que era proposta pelo rei dos lusitanos. Camões canta que o rei Samorim de Calecut estava indeciso entre o medo e a cobiça que tinha ao negociar com os portugueses.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

O medo do que pode acontecer se os portugueses realmente lhe atacassem deixava o coração do rei Samorim inquieto; por outro lado, a sua ambição, que por natureza ele estava sujeito, atiçava o desejo de enriquecer, pois sabia que seria muito proveitosos se aceitasse a aliança que era proposta pelo rei dos lusitanos.

CANTO VIII – ESTROFE 60

“O rei Samorim, estando indeciso, questiona o capitão Vasco da Gama, pergunta se ele se realmente é quem diz ser”

 

Sobre isto, nos conselhos que tomava,

Achava mui contrários pareceres;

Que naqueles com quem se aconselhava

Executava o dinheiro seus poderes.

O grande capitão chamar mandava,

A quem, chegado, disse: “Se quiseres

Confessar-me a verdade limpa e nua,

Perdão alcançarás da culpa tua.

 

Sobre isto, nos conselhos que tomava, achava mui contrários pareceres; que naqueles com quem se aconselhava executava o dinheiro seus poderes. O grande capitão chamar mandava, a quem, chegado, disse: “Se quiseres confessar-me a verdade limpa e nua, perdão alcançarás da culpa tua. (1)

(1) Com essa indecisão, o rei Samorim se voltava aos conselheiros, mas estes eram muito variados e contraditórios, pois, afinal, seus conselheiros estavam influenciados pelo dinheiro dos mouros. Mandou chamar o capitão Vasco da Gama e, estando sozinhos, diz: “Se quiseres confessar a verdade limpa e nua, garanto que lhe concederei o perdão por suas mentiras. Camões canta que o rei Samoriml, estando indeciso do que fazer, decide questionar o capitão Vasco da Gama diretamente, sem ninguém por perto para influencia-lo.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

Com essa indecisão, o rei Samorim se voltava aos conselheiros, mas estes eram muito variados e contraditórios, pois, afinal, seus conselheiros estavam influenciados pelo dinheiro dos mouros. Mandou chamar o capitão Vasco da Gama e, estando sozinhos, diz: “Se quiseres confessar a verdade limpa e nua, garanto que lhe concederei o perdão por suas mentiras.

CANTO VIII – ESTROFE 61

“O rei Samorim questiona o capitão Vasco da Gama, dizendo que as afirmações dele são mentirosas”

 

“Eu sou bem informado que a embaixada

Que de teu rei me deste, que é fingida;

Porque nem tu tens rei, nem pátria amada,

Mas vagabundo vais, passando a vida:

Que quem da Hespérida última alongada,

Rei ou senhor, de insânia desmedia,

Há-de vir cometer com naus e frotas,

Tão incertas viagens e remotas?

 

“Eu sou bem informado que a embaixada que de teu rei me deste, que é fingida; porque nem tu tens rei, nem pátria amada, mas vagabundo vais, passando a vida: que quem da Hespérida última alongada, rei ou senhor, de insânia desmedia, há-de vir cometer com naus e frotas, tão incertas viagens e remotas? (1)

(1) “Eu estou bem informado que a embaixada de seu rei é uma mentira, porque tu nem tens rei e nem uma amada pátria; na verdade, vives como um vagabundo. Pois, afinal, quem seria este monarca tão louco para mandar, lá das terras da Hispânia, uma frota para uma viagem tão incerta a terras tão remotas? Camões canta que o rei Samorim, acreditando nas mentiras dos sacerdotes e conselheiros indianos, diz que o capitão Vasco da Gama e os portugueses são piratas e que nenhum rei seria louco para mandar uma frota numa viagem tão distante e arriscada.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Eu estou bem informado que a embaixada de seu rei é uma mentira, porque tu nem tens rei e nem uma amada pátria; na verdade, vives como um vagabundo. Pois, afinal, quem seria este monarca tão louco para mandar, lá das terras da Hispânia, uma frota para uma viagem tão incerta a terras tão remotas?

CANTO VIII – ESTROFE 62

“O rei Samorim questiona o capitão Vasco da Gama, dizendo que, se ele veio de um grande reino, por que não trouxe nenhum grande presente”

 

“E se grandes reinos poderosos

O teu rei tem a régia majestade,

Que presentes me trazes valerosos,

Sinais de tua incógnita verdade?

Com peças e dons altos sumptuosos

Se lia dos Reis altos a amizade:

Que sinal nem penhor não é bastante

As palavras dum vago navegante!

 

“E se grandes reinos poderosos o teu rei tem a régia majestade, que presentes me trazes valerosos, sinais de tua incógnita verdade? Com peças e dons altos sumptuosos se lia dos Reis altos a amizade: que sinal nem penhor não é bastante as palavras dum vago navegante! (1)

(1) “E se o seu rei é soberano de grandes reinos como dizes, que presentes valiosos tu me trais para provar que é verdade? A amizade dos grandes reis se dá pelos presentes grandiosos e valiosos que são dados, não pelas palavras de um mero navegante. Camões canta que o rei Samorim de Calecut questiona a proposta de aliança com Portugal dizendo que os portugueses não trouxeram nenhum presente valioso que mostrasse que seu reino realmente era tão grandioso.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“E se o seu rei é soberano de grandes reinos como dizes, que presentes valiosos tu me trais para provar que é verdade? A amizade dos grandes reis se dá pelos presentes grandiosos e valiosos que são dados, não pelas palavras de um mero navegante.

CANTO VIII – ESTROFE 63

“O rei Samorim concluí o seu questionamento dizendo para o capitão Vasco da Gama confessar quem ele realmente é”

  

“Se porventura vindes desterrados,

Como já foram homens d’alta sorte,

Em meu reino sereis agasalhados;

Que a toda terra é pátria pera o forte;

Ou se piratas sois ao mar usados,

Dizei-mo sem temor de infância ou morte;

Que, por se sustentar, em toda idade

Tudo faz a vital necessidade.”

 

“Se porventura vindes desterrados, como já foram homens d’alta sorte, em meu reino sereis agasalhados; que a toda terra é pátria pera o forte; ou se piratas sois ao mar usados, dizei-mo sem temor de infância ou morte; que, por se sustentar, em toda idade tudo faz a vital necessidade.” (1)

(1) “Se, por caso, vos sois marinheiros sem-terra, como já foram muitos homens de alto valor, garanto que serão bem recebidos em meu reino, pois toda a terra é pátria para o homem forte. Ou se forem piratas, diga-me sem ter medo de qualquer castigo ou da morte, pois sei que, por necessidade, acaba-se fazendo o necessário para sobreviver. Camões canta que o rei Samorim, ao falar em privado com capitão Vasco da Gama, pergunta se eles são marinheiros nômades ou perdidos, ou se, na verdade, são piratas.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Se, por caso, vos sois marinheiros sem-terra, como já foram muitos homens de alto valor, garanto que serão bem recebidos em meu reino, pois toda a terra é pátria para o homem forte. Ou se forem piratas, diga-me sem ter medo de qualquer castigo ou da morte, pois sei que, por necessidade, acaba-se fazendo o necessário para sobreviver.”

CANTO VIII – ESTROFE 64

“O capitão Vasco da Gama escuta os falsos questionamento do rei Samroim, já tendo ele previsto que os muçulmanos tentariam alguma artimanha”

 

Isto assi dito, o Gama, que já tinha

Suspeitas das insídias que ordenava

O maomético ódio, donde vinha

Aquilo que tão mal o rei cuidava,

C’uma alta confiança, que convinha,

Com que seguro crédito alcançava,

Que Vênus Acidália lhe influía,

Tais palavras do sábio peito abria:

 

Isto assi dito, o Gama, que já tinha suspeitas das insídias que ordenava o maomético ódio, donde vinha aquilo que tão mal o rei cuidava, c’uma alta confiança, que convinha, com que seguro crédito alcançava, que Vênus Acidália lhe influía, tais palavras do sábio peito abria (1)

(1) Tendo isso dito o rei Samormi, o capitão Vasco da Gama, que já suspeitava das tramoias que odiosos muçulmanos preparavam e das quais o rei tão mal acreditava, responde os questionamentos do monarca indiano com a alta confiança, certeza e a inspiração de Vênus, dizendo estas sábias palavras. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, após ouvir os questionamentos do rei Samorim de Calecut, dá a seguinte resposta [continua na próxima estrofe].

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

Tendo isso dito o rei Samorim, o capitão Vasco da Gama, que já suspeitava das tramoias que odiosos muçulmanos preparavam e das quais o rei tão mal acreditava, responde os questionamentos do monarca indiano com a alta confiança, certeza e a inspiração de Vênus, dizendo estas sábias palavras.

CANTO VIII – ESTROFE 65

“O capitão Vasco da Gama responde o rei Samorim, dizendo que tais afirmações são mentiras inventadas pelos sacerdotes mouros de Calecut”

 

“Se os antigos delitos, que a malícia

Humana cometeu na prisca idade

Não causaram que o vaso da iniquícia

Açoute tão cruel da Cristandade,

Viera pôr perpétua inimicícia

Na geração de Adão, co’a falsidade

(Ó poderoso rei) da torpe seita,

Não conceberas tu tão má suspeita!

 

“Se os antigos delitos, que a malícia humana cometeu na prisca idade não causaram que o vaso da iniquícia açoute tão cruel da Cristandade, viera pôr perpétua inimicícia na geração de Adão, co’a falsidade (ó poderoso rei) da torpe seita, não conceberas tu tão má suspeita! (1)

(1) “Se os antigos pecados que a malícia humana cometeu no tempo da criação do mundo não tivessem acontecido e influenciado Maomé, o vaso da iniquidade e açoute cruel da Cristandade, os muçulmanos não o teriam influenciado, ó poderoso rei Samorim, e tu não conceberias está tão má suspeita. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, ao responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, diz que essas acusações não passam de mentiras inventadas pelos muçulmanos, já que este tem uma profunda desavença com os cristãos. ~

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Se os antigos pecados que a malícia humana cometeu no tempo da criação do mundo não tivessem acontecido e influenciado Maomé, o vaso da iniquidade e açoute cruel da Cristandade, os muçulmanos não o teriam influenciado, ó poderoso rei Samorim, e tu não conceberias está tão má suspeita.

CANTO VIII – ESTROFE 66

“O capitão Vasco da Gama lamenta que o rei Samorim duvide dele”

 

“Mas porque nenhum grande bem se alcança

Sem grandes opressões, e em todo o feito

Segue o temor os passos da esperança,

Que em suor vive sempre de seu peito,

Me mostras tu tão pouca confiança

Desta minha verdade, sem respeito

Das razões em contrário, que acharias

Se não cresses a quem não crer devias.   

 

“Mas porque nenhum grande bem se alcança sem grandes opressões, e em todo o feito segue o temor os passos da esperança, que em suor vive sempre de seu peito, me mostras tu tão pouca confiança desta minha verdade, sem respeito das razões em contrário, que acharias se não cresses a quem não crer devias. (1)

(1) “Mas como nenhuma grande realização se faz sem grandes sofrimentos e porque, durante estes feitos, o medo segue os passos da esperança que vive sempre no suor do nosso peito, tu, ó grande rei, mostras tão pouca confiança no que digo enquanto acredita em quem não deveria. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, ao responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, diz que ele já esperava encontrar mais dificuldades em sua empreitada.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Mas como nenhuma grande realização se faz sem grandes sofrimentos e porque, durante estes feitos, o medo segue os passos da esperança que vive sempre no suor do nosso peito, tu, ó grande rei, mostras tão pouca confiança no que digo enquanto acredita em quem não deveria.

CANTO VIII – ESTROFE 67

“O capitão Vasco da Gama diz que, se fosse um pirata ou algum nômade, jamais se arriscaria numa empreitada tão perigosa”

 

“Por que, se eu de rapinas só vivesse,

Undívago, ou da pátria desterrado,

Como crês que tão longe me viesse

Buscar assento incógnito e apartado?

Por que esperanças, ou por que interesse

Viria exp’rimentados o mar irado,

Os antárticos frios, e os ardores

Que sofrem do Carneiro os moradores?

 

“Por que, se eu de rapinas só vivesse, undívago, ou da pátria desterrado, como crês que tão longe me viesse buscar assento incógnito e apartado? Por que esperanças, ou por que interesse  viria exp’rimentados o mar irado, os antárticos frios, e os ardores que sofrem do Carneiro os moradores? (1)

(1) “Seu eu realmente fosse um pirata saqueador ou um vagabundo sem pátria, por que motivo eu viria de tão longe buscar repouso nesta terra tão estranha e distante? Com quais esperanças ou interesses eu enfrentaria os furiosos mares, os frios antárticos, ou até os calores que sofrem aqueles que habitam as regiões do trópico de Áries? Camões canta que o capitão Vasco da Gama, ao responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, diz que não faria sentido algum ele fazer toda essa viagem apenas para saquear ou para vagabundear por aí.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Seu eu realmente fosse um pirata saqueador ou um vagabundo sem pátria, por que motivo eu viria de tão longe buscar repouso nesta terra tão estranha e distante? Com quais esperanças ou interesses eu enfrentaria os furiosos mares, os frios antárticos, ou até os calores que sofrem aqueles que habitam as regiões do trópico de Áries?

CANTO VIII – ESTROFE 68

“O capitão Vasco da Gama disse que desta vez não trouxe nenhum grande presente, mas que, na próxima visita, o rei Samorim será muito bem presenteado”

 

“Se com grandes presentes d’alta estima

O crédito me pedes do que digo,

Eu não vim mais que a achar o estranho clima

Onde a natura pôs teu reino antigo.

Mas se a fortuna tanto me sublima,

Que eu torne à minha pátria e reino amigo,

Então verás o dom soberbo e rico

Com que minha tornada certifico.

 

“Se com grandes presentes d’alta estima o crédito me pedes do que digo, eu não vim mais que a achar o estranho clima onde a natura pôs teu reino antigo. Mas se a fortuna tanto me sublima, que eu torne à minha pátria e reino amigo, então verás o dom soberbo e rico com que minha tornada certifico. (1)

(1) “Se espera que eu prove o que digo lhe dando grandes e caros presentes, digo que agora não tenho, pois, ao querer fazer esta viagem, eu apenas vim para ver o clima da região onde está este seu antigo reino. Mas, se boa sorte me favorecer e eu conseguir retornar para à minha pátria e ao teu reino amigo, verás então os caros e soberbos presentes que receberás. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, ao responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, diz que não trouxe presentes caros pois não acreditou que seria necessário para viagem, mas, garante que, ao retornar, trará presentes dignos de um monarca.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Se espera que eu prove o que digo lhe dando grandes e caros presentes, digo que agora não tenho, pois, ao querer fazer esta viagem, eu apenas vim para ver o clima da região onde está este seu antigo reino. Mas, se boa sorte me favorecer e eu conseguir retornar para à minha pátria e ao teu reino amigo, verás então os caros e soberbos presentes que receberás.

CANTO VIII – ESTROFE 69

“O capitão Vasco da Gama diz que, para o povo português, nenhuma empreitada é impossível, muito menos esta que eles fizeram”

 

“Se te parece inopinado feito

Que rei da última Hespéria a ti me mande,

O coração sublime, o régio peito

Nenhum caso possíbil tem por grande.

Bem parece que o nobre e grão conceito

Do lusitano espírito demande

Maior crédito e fé de mais alteza,

Que creia dele tanta fortaleza.

 

“Se te parece inopinado feito que rei da última Hespéria a ti me mande, o coração sublime, o régio peito nenhum caso possíbil tem por grande. Bem parece que o nobre e grão conceito do lusitano espírito demande maior crédito e fé de mais alteza, que creia dele tanta fortaleza. (1)

(1) “Se te espanta que o um rei da península Hispânica me mande a ti, digo que, para o sublime coração deste rei e sua coragem, nenhuma empreitada é impossível. Bem parece que o nobre e grão conceito do espírito lusitano mereça mais crédito do que tu lhe dás e demande mais fé do que a vossa, fé esta que acredite na fortaleza do espírito lusitano. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, ao responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, diz que, para os portugueses, nenhuma empreitada é impossível; também pede mais crédito e fé em seu povo.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Se te espanta que o um rei da península Hispânica me mande a ti, digo que, para o sublime coração deste rei e sua coragem, nenhuma empreitada é impossível. Bem parece que o nobre e grão conceito do espírito lusitano mereça mais crédito do que tu lhe dás e demande mais fé do que a vossa, fé esta que acredite na fortaleza do espírito lusitano.

CANTO VIII – ESTROFE 70

“O capitão Vasco da Gama diz os portugueses sempre se lançaram em grandes desafios, sendo que agora as grandes navegações o foco do seu povo”

 

“Sabe que há muito anos que os antigos

Reis nossos firmemente propuseram

De vencer os trabalhos e perigos

Que sempre às grandes cousas se opuseram:

E descobrindo os mares inimigos

Do quieto descanso, pretenderam

De saber que fim tinham e onde estavam

As derradeiras praias que lavavam.

 

“Sabe que há muito anos que os antigos reis nossos firmemente propuseram de vencer os trabalhos e perigos que sempre às grandes cousas se opuseram: e descobrindo os mares inimigos do quieto descanso, pretenderam de saber que fim tinham e onde estavam as derradeiras praias que lavavam. (1)

(1) “Saiba que há muito tempo que os antigos reis portugueses se propuseram firmemente a vencer os trabalhos e perigos que sempre se opuseram às grandes realizações; e eles pretendem, ao descobrir o quieto descanso dos mares inimigos, saber que fim tinham esses mares e onde estavam as terras que eles banhavam. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, ao responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, diz que os reis portugueses mandam seus homens explorar os mares para descobrir novas terras.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Saiba que há muito tempo que os antigos reis portugueses se propuseram firmemente a vencer os trabalhos e perigos que sempre se opuseram às grandes realizações; e eles pretendem, ao descobrir o quieto descanso dos mares inimigos, saber que fim tinham esses mares e onde estavam as terras que eles banhavam.

CANTO VIII – ESTROFE 71

“O capitão Vasco da Gama diz que foi D. Henrique, filho do rei João I, o primeiro dos portugueses a desejar desbravar os mares”

 

“Conceito digno foi do ramo claro

Do venturoso rei, que arou primeiro

O mar, por ir deitar no ninho caro

O morador Abila derradeiro.

Este, por sua indústria e engenho raro,

Num madeiro ajuntando outro madeiro,

Descobrir pôde a parte que faz clara

De Argos, da Hidra a luz, da Lebre e da Ara.

 

“Conceito digno foi do ramo claro do venturoso rei, que arou primeiro o mar, por ir deitar no ninho caro o morador Abila derradeiro. Este, por sua indústria e engenho raro, num madeiro ajuntando outro madeiro, descobrir pôde a parte que faz clara de Argos, da Hidra a luz, da Lebre e da Ara. (1)

(1) O intuito destas empreitadas marítimas foi do infante D. Henrique, filho do venturoso rei D. João I, o primeiro monarca a desbravar os mares e ir conquistas a terras de Ceuta. D. Henrique, com suas grandes capacidades, construiu as navegações que descobriram as terras africanas iluminadas pelas constelações de Argos, da Hidra, da Lebre e da Ara. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, ao responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, diz que a ideia de desbravar os mares foi de D. Henrique, este que construiu nas naus que atravessaram a costa africana pela primeira vez.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

O intuito destas empreitadas marítimas foi do infante D. Henrique, filho do venturoso rei D. João I, o primeiro monarca a desbravar os mares e ir conquistas a terras de Ceuta. D. Henrique, com suas grandes capacidades, construiu as navegações que descobriram as terras africanas iluminadas pelas constelações de Argos, da Hidra, da Lebre e da Ara.

CANTO VIII – ESTROFE 72

“O capitão Vasco da Gama diz que, conforme os portugueses eram bem-sucedidos em suas viagens, mais e mais empreitadas eram lançadas”

 

“Crescendo c’os sucessos bons primeiros

No peito as ousadias, descobriram

Pouco e pouco caminhos estrangeiros,

Que uns sucedendo aos outros prosseguiram:

De África os moradores derradeiros

Austrais, que nunca as sete flamas viram,

Foram vistos de nós, atrás deixando

Quantos estão os trópicos queimando.

 

“Crescendo c’os sucessos bons primeiros no peito as ousadias, descobriram pouco e pouco caminhos estrangeiros, que uns sucedendo aos outros prosseguiram: De África os moradores derradeiros Austrais, que nunca as sete flamas viram, foram vistos de nós, atrás deixando quantos estão os trópicos queimando. (1)

(1) Os reis de Portugal, conforme eram bem sucedidos nas viagens marítimas, ficam mais ousados e, assim, iam descobrindo novos caminhos, com um rei prosseguindo depois do outro. Os moradores da região Sul da África, que nunca tinham visto a constelações do Norte, foram vistos por nós, que deixamos para trás aqueles que estão queimando nos trópicos. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, ao responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, diz que, conforme as navegações eram bem sucedidas, os portugueses alcançavam locais cada vez mais distantes.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

Os reis de Portugal, conforme eram bem sucedidos nas viagens marítimas, ficam mais ousados e, assim, iam descobrindo novos caminhos, com um rei prosseguindo depois do outro. Os moradores da região Sul da África, que nunca tinham visto a constelações do Norte, foram vistos por nós, que deixamos para trás aqueles que estão queimando nos trópicos.

CANTO VIII – ESTROFE 73

“O capitão Vasco da Gama diz que, após muito esforço e sucesso, os portugueses decidiram que o próximo desafio seria alcançar as terras da Índia”

 

“Assi, com firme peito e com tamanho

Propósito, vencemos a Fortuna,

Até que nós no teu terreno estranho

Viemos pôr a última coluna.

Rompendo a força do líquido estranho,

Da tempestade horrífica e importuna,

A ti chegamos, de quem só queremos

Sinal que ao nosso rei de ti levamos.

 

“Assi, com firme peito e com tamanho propósito, vencemos a Fortuna, até que nós no teu terreno estranho viemos pôr a última coluna. Rompendo a força do líquido estranho, da tempestade horrífica e importuna, a ti chegamos, de quem só queremos sinal que ao nosso rei de ti levamos. (1)

(1) Assim, com coragem e com tão grande propósito, vencemos a Fortuna, até que nós viemos no teu terreno, rei Samorim, e colocamos a última coluna da nossa viagem. Rompemos a força dos mares, das horríveis e importunas tempestades, a ti chegamos, de quem só queremos sinal que levamos de ti ao nosso rei. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, ao responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, diz que, conforme realizavam as navegações, chegou a vez dos portugueses alcançarem as terras da Índia, sendo este o motivo dele estar em Calecut.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

Assim, com coragem e com tão grande propósito, vencemos a Fortuna, até que nós viemos no teu terreno, rei Samorim, e colocamos a última coluna da nossa viagem. Rompemos a força dos mares, das horríveis e importunas tempestades, a ti chegamos, de quem só queremos sinal que levamos de ti ao nosso rei.

CANTO VIII – ESTROFE 74

“O capitão Vasco da Gama diz que fala a verdade”

 

“Está é a verdade, rei; que não faria

Por tão incerto bem, tão fraco prêmio,

Qual, não sendo isto assi; esperar podia,

Tão longo, tão fingido e vão proêmio;

Mas antes descansar me deixaria

No nunca descansado e fero grêmio

Da madre Tétis, qual pirata inico,

Dos trabalhos alheios feito rico.

 

“Está é a verdade, rei; que não faria por tão incerto bem, tão fraco prêmio, qual, não sendo isto assi; esperar podia, tão longo, tão fingido e vão proêmio; Mas antes descansar me deixaria no nunca descansado e fero grêmio da madre Tétis, qual pirata inico, dos trabalhos alheios feito rico. (1)

(1) “Está é a verdade, rei; se não fosse isto, eu não faria tão longo, fingido e vão discurso em troca de saques e roubos, como acredita. Em vez disso, eu ficaria descansando nos ferozes e nunca descansados mares de Tétis e viveria como iníquo pirata, roubando e ficando rico com as coisas dos outros. Camões canta que o capitão Vasco da Gama, ao responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, diz que essa é a verdade e esse é motivo de sua empreitada rumo ao Oriente.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Está é a verdade, rei; se não fosse isto, eu não faria tão longo, fingido e vão discurso em troca de saques e roubos, como acredita. Em vez disso, eu ficaria descansando nos ferozes e nunca descansados mares de Tétis e viveria como iníquo pirata, roubando e ficando rico com as coisas dos outros.

CANTO VIII – ESTROFE 75

“O capitão Vasco da Gama concluí a sua resposta e pede para o rei Samorim aceitar a aliança com Portugal”

 

“Assi que, ó Rei, se minha grã verdade

Tens por qual é, sincera e não dobrada,

Ajunta-me ao despacho brevidade,

Não me impidas o gosto da tornada.

E se inda te parece falsidade,

Cuida bem na razão que está provada,

Que com claro juízo pode ver-se;

Que fácil é a verdade d’ entender-se.”

 

“Assi que, ó Rei, se minha grã verdade tens por qual é, sincera e não dobrada, ajunta-me ao despacho brevidade, não me impidas o gosto da tornada. E se inda te parece falsidade, cuida bem na razão que está provada, que com claro juízo pode ver-se; que fácil é a verdade d’ entender-se.” (1)

(1) “Desta forma, ó rei Samorim, se acreditas que o que eu disse é verdade, e não um fingimento, aceite a proposta de aliança com Portugal, me fazendo retornar para casa com boas notícias. E, se o que eu disse ainda parece ser mentira, pense bem nos motivos que eu expus, pois é possível ver isso em ter juízo, já que a verdade é facilmente compreensível. Camões canta que o capitão Vasco da Gama termina de responder os questionamentos do rei Samorim de Calecut, reafirmando que tudo que ele disse é verdade e pedindo para que o monarca indiano aceite a proposta de aliança com Portugal.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

“Desta forma, ó rei Samorim, se acreditas que o que eu disse é verdade, e não um fingimento, aceite a proposta de aliança com Portugal, me fazendo retornar para casa com boas notícias. E, se o que eu disse ainda parece ser mentira, pense bem nos motivos que eu expus, pois é possível ver isso em ter juízo, já que a verdade é facilmente compreensível.

CANTO VIII – ESTROFE 76

“O rei Samorim fica convencido com o que o capitão Vasco da Gama disse, aceitando a proposta de aliança com Portugal”

 

Atento estava o Rei na segurança

Com que provara o Gama o que dizia;

Concebe dele certa confiança,

Crédito firme em quanto proferida.

Pondera das palavras a abastança,

Julga na autoridade grã valia:

Começa de julgar por enganados

Os Catuais corruptos, mal julgados.

 

Atento estava o Rei na segurança com que provara o Gama o que dizia; concebe dele certa confiança, crédito firme em quanto proferida. Pondera das palavras a abastança, julga na autoridade grã valia: Começa de julgar por enganados os Catuais corruptos, mal julgados. (1)

(1) O rei Samorim escutava o capitão Vasco da Gama, prestando muita atenção como ele, de uma forma muito segura, provava que dizia a verdade; por ele concebeu uma certa confiança, dando firme crédito ao que o português proferia. Ponderava a forma como ele dizia suas palavras, julgando haver uma grande autoridade no que dizia. Desta forma, começa a acreditar que os ministros estavam enganados, pensando que estivessem corrompidos. Camões canta que o rei Samorim, após ouvir os argumentos do capitão Vasco da Gama, começa a acreditar no que dizia o português e a duvidar de seus conselheiros.

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

O rei Samorim escutava o capitão Vasco da Gama, prestando muita atenção como ele, de uma forma muito segura, provava que dizia a verdade; por ele concebeu uma certa confiança, dando firme crédito ao que o português proferia. Ponderava a forma como ele dizia suas palavras, julgando haver uma grande autoridade no que dizia. Desta forma, começa a acreditar que os ministros estavam enganados, pensando que estivessem corrompidos.

CANTO VIII – ESTROFE 77

“O rei Samorim dispensa o capitão Vasco da Gama, dizendo para ele ir pegar algumas mercadorias para levar para Portugal”

 

Juntamente a cobiça do proveito,

Que espera do contrato lusitano,

O faz obedecer e ter respeito

C’o capitão, e não c’o mauro engano.

Enfim, ao Gama manda que direito

Às naus se vá, e seguro d’algum dano

Possa a terra mandar qualquer fazenda,

Que pela especiaria troque e venda.

 

Juntamente a cobiça do proveito, que espera do contrato lusitano, o faz obedecer e ter respeito c’o capitão, e não c’o mauro engano. Enfim, ao Gama manda que direito às naus se vá, e seguro d’algum dano possa a terra mandar qualquer fazenda, que pela especiaria troque e venda. (1)

(1) Tendo, enfim, se deixado levar pela cobiça, o rei Samorim aceita a aliança com Portugal e, por tanto, não segue os conselhos dos mentirosos muçulmanos. Manda que o capitão Vasco da Gama retorne para às suas naus para descansar e, depois, que vá até as fazendas adquirir as especiarias. Camões canta que o rei Samorim decide confiar no capitão Vasco da Gama, aceitando o contrato de aliança com Portugal.   

Podemos, portanto, entender que a estrofe diz que:

Tendo, enfim, se deixado levar pela cobiça, o rei Samorim aceita a aliança com Portugal e, por tanto, não segue os conselhos dos mentirosos muçulmanos. Manda que o capitão Vasco da Gama retorne para às suas naus para descansar e, depois, que vá adquirir as especiarias.

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Obra completa de Camões com notas e comentários de Francisco de Sales Lencastre, sendo a melhor edição para quem busca compreender todos os detalhes deste grande épico.

 

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Os Lusíadas (Edição Didática) – Volume II

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Esses foram os nossos comentários sobre a quinquagésima oitava até a septuagésima sétima estrofe do oitavo canto de Os Lusíadas, onde Camões canta os questionamentos que o rei Samorim de Calecut faz ao capitão Vasco da Gama.

 

Eu sou Caio Motta e convido você a continuar acompanhando os nossos comentários sobre a grande obra de Camões, bem como demais textos da grande literatura universal presentes no nosso blog.

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